28 novembro 2009

O Primeiro-Ministro e o cidadão

.
Disse o semanário "Sol" que o primeiro ministro mentiu ao Parlamento sobre a TVI, quando em 24 de Junho negou que estivesse a par fosse do que fosse sobre a compra desta estação de televisão pela PT. Prova: as conversas entre Vara e Sócrates entretanto objecto de escuta, já versavam o assunto.

Disse o primeiro ministro que não mentiu. Prova: porque "uma coisa é, naturalmente, discutirmos com amigos, como fiz, relativamente a notícias que são publicadas nos jornais e a conhecimentos informais; outra coisa é, como disse no parlamento, como primeiro ministro, o conhecimento oficial do negócio" entre a PT e a TVI.

Confesso que estou bem mais preocupado com este esfarrapado argumento do que com a suposta mentira. É que isto de alegar que se desconhece como primeiro-ministro o que se conhece como cidadão (mas que não se revela), é como defender que a mesma pessoa ou individualidade possui um lado A e um lado B, perfeitamente autónomos, distintos e incomunicáveis entre si. Ora eu, pelo menos, não conheço ninguém assim. Quer dizer, não conhecia.

Mas agora que a coisa se tornou pública não resisto a sugerir, nomeadamente, aos senhores deputados e aos senhores jornalistas que, de futuro, perguntem logo a Sócrates o que pensa como primeiro-ministro mas também o que pensa como cidadão. Pelos vistos, não é bem a mesma coisa.

14 novembro 2009

Eles não contavam com isto

"É muito superior àquilo com que que contávamos" - disse hoje José Sócrates a propósito do crescimento de 0,9% da nossa economia, segundo dados revelados pelo INE.

O que quer dizer que o Governo e o Primeiro-Ministro não fazem a mínima ideia do resultado a que levam ou podem levar as suas políticas. Foram agora surpreendidos por um número bem acima daquele com que contavam, tal como amanhã poderão ser confrontados com um número bem abaixo do que irão prever. Mas se um Governo não sabe com o que pode contar, é porque não tem verdadeira consciência do que anda a fazer. Não é isto preocupante?

A triste figura da boa imprensa

10 novembro 2009

Pesca ao ilícito


in Publico Online, 08 Nov 2009

Para ser franco, não vejo como é que Armando Vara e José Sócrates poderão vir a ser acusados quando, pelos vistos, o próprio Procurador da Republica precisa de mais de quatro meses para concluir se na conversa telefónica em causa há ou não há alguma alusão a factos ílicitos.

Se para um jurista de alto gabarito, ainda agora não são suficientes quatro meses para encontrar qualquer ilicitude, como poderiam na altura os dois não juristas (Vara e Sócrates) ter imediata consciência de que estariam a cometer um ilícito?

01 novembro 2009

Como um verdadeiro artista


Fez bem. Porque nem é o candidato ideal, nem o cargo o faria feliz. É até muito provável que o argumento da falta de unidade do partido tenha sido apenas uma maneira airosa de fugir ao aperto. Porque o professor é, a vários títulos, uma personalidade notável: um notável jurista, um notável professor, um notável comentador político. Mas convenhamos: não é um notável político.

Uma coisa é conhecer a fundo uma arte. Outra, bem diferente, é ser um verdadeiro artista. Ora como já vimos aquando da sua primeira passagem pela liderança do PSD, o professor não é um verdadeiro artista como político, nem coisa que se lhe pareça. Não tem carisma popular (ou populista, vai dar no mesmo). É muito bom no que pensa, é muito bom no que diz, mas depois, nem se ri para o povo com aquela falsa naturalidade que os grandes políticos cedo aprendem (ou que já está dentro deles), nem dramatiza, nem (se) emociona, nem arrebata multidões. E assim, não dá. O povo não quer ser enganado. Mas desde quando bastou ser competente e verdadeiro para o conquistar?

Paciência. As coisas são como são e é como são que devemos encará-las. Pertencendo grande parte desse povo ao próprio PSD, o insucesso seria prognosticável. O professor não tem feitio (nem paciência) para ir agora combater adversários onde deveria encontrar apoiantes. Restaria, enfim, uma leve hipótese: a de ser levado ao colo por uma equipa de prestigiados militantes que estivessem dispostos não apenas a apoiar o seu nome para a presidência do partido, mas também para se manterem a seu lado, no duro combate político que se avizinha. Mas a meia dúzia de manifestações de apoio entretanto tornadas públicas, parece que são apenas isso: manifestações de apoio. E nestas condições, o invocado argumento da falta de unidade no partido, serviu às mil maravilhas para o professor sair por onde entrou. Aqui sim, como um verdadeiro artista.